O sistema democrático criou a ilusão de que é o povo quem manda. Para isso é necessário que haja toda forma de aceitação do povo através da opinião pública e que também se reflete nas eleições. Ainda existe quem manda, mas o cidadão comum precisar achar que não é controlado, por mais que tenha ciência que não controla, e aquele que representa o sonho do povo de ser rei precisa ser avalizado pela opinião pública. Como as eleições são um grande circo em que o povo patrocina o palhaço, que ri, cai, deita, rola e faz tudo aquilo que agrada ao espectador, pensando na contraprestação, os políticos precisam do povo para autorizar o poder que pretendem ter. O poder emana do povo e é preciso que o povo dê o poder. Aquele que quer poder precisa que o povo autorize este poder pois o sistema democrático assim exige e a situação necessária para isto é através do medo. A questão é quando esta ameaça criadora do medo é real ou apenas aparente, meramente criada através de mecanismos obscuros para fazer a população acreditar que existe um caos lá fora, que este caos precisa ser solucionado e que para isso precisam da autorização do povo para solucionar o problema.
O medo cria escravos. É através do medo que aquele que quer poder o consegue para fazer o que bem entender. O medo desperta os instintos mais primários e bestiais e faz aflorar o instinto de auto-preservação inerente a todo ser vivo. A primeira necessidade do ser vivo é manter-se vivo e isto através da garantia de sua integridade. Um grupo ameaçado em sua integridade ao deparar-se com aquele que pode salvar-lhes e afastar o perigo avaliza o que for necessário, sacrificando até mesmo suas garantias fundamentais, para que o problema seja solucionado. Dão o poder que for para aquele que detenha o remédio para a cura de seu doença. Estes poderes que são conferidos, entretanto, jamais seriam repassados em situação comum e de tranquilidade. Uma comunidade não autorizaria o Estado a adentrar em sua residência no repouso noturno, mas em uma situação de medo, a fim de garantir a segurança de todos, avaliza a conduta do poder público em favor da coletividade. Assim fazem os políticos ao colherem votos, a mídia com o sensacionalismo e todo aquele que quer aval do povo; mostram o problema, a violência, e vendem a solução, suas ações no poder. O povo então acaba sempre achando que há um mal lá fora e que precisa de alguém que o salve.
As mentiras que falam sobre a violência começam com a forma em que são ventiladas nos meios de comunicação. A propaganda é sempre fazer acreditar que o problema é incontrolável, que a população não consegue resolver por si só e que é preciso fazer alguma coisa, sendo que haverá alguém para que resolva o problema. Utilizam-se de um crime violento para tentar fazer acreditar que há o caos, como se o número de efetivo policial, e que depende de política pública, pudesse evitar que alguém enciumado tirasse a vida de outro, como se fosse culpa do poder executivo que uma pessoa movida por sentimentos puramente íntimos e pessoais se voltasse contra outrem. Se alguém mata o outro por ciúmes, inveja, raiva, ódio, cobiça ou ganância é óbvio que isto não é culpa do prefeito, do governador, do presidente, dos deputados, dos vereadores, dos senadores ou da polícia. Isto é um caso pessoal que independe de qualquer fator externo, mas não é interessante para a mídia e para a política que seja expresso desta forma. Dizer às pessoas que a culpa é delas e que depende delas mudarem a situação não iria lhes trazer privilégios, não lhes daria poder, então, reverte-se tudo, coloca-se a culpa na administração e vende-se a solução na administração e assim consegue-se moldar a opinião pública como bem quiser.
É assim que mentem sobre a violência, aproveitando-se da dificuldade de raciocínio das pessoas para lhes embutir idéias tendenciosas. Uma pessoa comete um crime por um motivo pessoal qualquer, mas isto não é interessante vender ao povo, então, pega-se uma situação qualquer, como a ideologia da pessoa, para fazer a população acreditar que foi por esta ideologia que o crime ocorreu, assim, gera-se uma reprimenda coletiva à esta ideologia, mesmo que ela não tenha sido importante no cometimento do crime. A aplicação mais visível disto é quando envolve religiões e crenças. Se é encontrado um símbolo ocultista no quarto de alguém que cometeu um crime haverá mais foco do envolvimento do criminoso com o ocultismo do que o verdadeiro motivo do crime. Os verdadeiros motivos, os sentimentos mais internos que cada um têm, jamais são expostos a título de esclarecimento da violência, sempre é preciso utilizar-se de mecanismos de controle e manipulação das massas. O uso de drogas é utilizado pelo Estado da mesma forma. Se uma pessoa que usa drogas comete um crime por ciúmes a mídia não vai focar no problema dos ciúmes mas na questão das drogas. Ciúmes não movimentam políticas de combate aos sentimentos baixos mas drogas movimentam grandes fortunas em políticas públicas de combate a entorpecentes. Se um usuário de drogas cometeu um crime, não importa o motivo, a mídia sempre enfocará o uso de drogas, assim como vende-se que há associação para o tráfico apenas por estarem juntos dois ou mais usuários. Criando a ilusão de que toda a violência do mundo decorre do uso de drogas cria-se a ilusão de que a solução virá pela repressão, que dependerá da conivência da sociedade que dará o poder necessário para solucionar aquilo que pensa ser um problema.
Uma pessoa dominada por sentimentos baixos e determinada a cometer um crime cometerá o crime e não há inferno, prisão ou pena de morte que a iniba disso e não há nada que o poder público possa fazer. O Estado não tem como colocar policiais armados dentro de cada domicílio de cada cidadão fiscalizando a todos em tempo integral, por isso que a política é inútil nestes casos. Não há nada que o Estado ou qualquer político possa fazer em relação a isto, apenas as pessoas. As pessoas precisam aprender a eliminar pensamentos e emoções baixas para que crimes passionais deixem de existir. A mídia sempre alterará a passionalidade dos crimes tentando fazer crer que isto é um problema de segurança pública e os políticos irão querer entregar “soluções” que dependerão do voto do povo e da concordância em lhes dar mais poder. O político que quer poder vai jogar isso sempre ao povo, a violência como um problema e ele como a solução, assim vai pedir votos e depois de eleito pedirá aval para fazer o que bem entender. Todo país do mundo vive problemas de violência que podem ser resolvidos com policiamento ostensivo, maior efetivo de policiais e atuação do poder público, como os casos em que envolvem quadrilhas e crime organizado, mas a maioria avassaladora dos crimes decorrem de pensamentos e emoções baixas das pessoas que deixando-se levar por coisas pequenas atentam contra outrem, e quanto a isso, ninguém pode fazer nada, vai das pessoas mudarem. Um maior efetivo policial não fará um ciumento deixar de ser ciumento, penas maiores não tornarão o vingativo menos vingativo e trocar um político por outro não fará o odioso menos odioso.
O pandemônio criado pela mídia em cima da questão da violência se tornou roteiro de campanha eleitoral daqueles que se aproveitam da maior fraqueza que uma pessoa pode ter, o medo, para obterem aquilo que mais querem, o poder. O político honesto, o que quer ajudar de verdade, jamais vai pedir poder, ele nunca irá se colocar como aquele que soluciona os problemas da violência, até porque ele não pode. O político honesto vai querer dividir a responsabilidade, vai querer ajudar e sempre vai deixar claro que os crimes passionais, os movidos por sentimentos e pensamentos baixos, são responsabilidade do povo e o povo deve mudar para que isso cesse. O político que merece voto nunca vai dizer que um crime passional, cometido por raiva, ódio ou ciúmes, é questão de segurança pública e jamais vai pedir poder para resolver isto. Quando o político faz campanha pedindo votos dizendo que vai solucionar a questão da segurança ele está se utilizando do medo que as pessoas têm para conseguir votos e conseguir poder. A mídia ajuda quando mente as causas verdadeiras dos crimes e quando tenta fazer o povo achar que há um problema que precisa ser resolvido por uma administração pública. A segurança não é questão de troca de governos, mas de consciência. As pessoas precisam parar de cultivar sentimentos e pensamentos baixos, aprender a perdoar, aprender a esquecer mágoas, aprender a continuar suas vidas independente de terem sido magoadas ou traídas e isso ninguém pode fazer por elas.
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