O Natal é o assassino-mor das desculpas esfarrapadas para não presentear o próximo. Por ser a celebração mais importante do ano e diretamente relacionado ao encerramento do ano o Natal é a paulada definitiva nas enrolações das pessoas que relutam o ano todo em comprar algo para os outros. Desculpas para não presentear é o que não faltam. Seja a falta de dinheiro, de tempo ou a desculpa de que o que importa é o sentimento; o homem é mais criativo que Deus ao arrumar desculpas para justificar-se. A pessoa pode enrolar na Páscoa, dia dos pais, dia das mães, datas comemorativas especiais de cada nicho e vez ou outra até em aniversários, mas quando chega o Natal não tem jeito. Pra quem quer fazer a social, puxar o saco ou para quem sente-se obrigado a agradecer, o Natal é a época em que se acaba abrindo a carteira mesmo e comprando os presentes que antes não haviam sido comprados. Entretanto, muitos destes presentes acabam sendo comprados pelos próprios demônios de cada um, pelos seus próprios Egos. As pessoas de mãos dadas com seus próprios demônios comprando presentes para o dia do nascimento de Jesus, o Cristo.
Existem os presentes dados por interesse onde a pessoa compra algo para puxar o saco esperando que o presente possa vir a causar determinado impacto no consciente de quem recebe, e o resultado esperado acontece. Todo mundo gosta de receber presentes. Por mais que as pessoas falem que o importante é o sentimento, um bom presente causa um sorriso maior e mais duradouro do que um abraço. Quem quer algo de alguém e precisa agradar para isso vai conseguir mais facilmente o que quer com um bom presente do que com uma frase bonita. As pessoas sabem disso, por mais que digam que não é bem assim. Presentes bons para as pessoas são como ossos para cachorros. O seu cachorro não vai se importar se receber um osso do vizinho e o cachorro do vizinho não vai se importar se receber um osso seu. O que importa é o osso e com um osso você conquista um cachorro. Para as pessoas os bons presentes são a mesma coisa. O que importa é o presente e quanto melhor, melhor. O homem nasce e vive para querer. O querer move o mundo. O homem quer aquilo que sabe que quer e até mesmo aquilo que não sabe se quer. O presente dado satisfaz o querer do homem.
Um dos presentes mais comuns é o eivado de egoísmo puro. Aquilo que é comprado e dado por projeção e que apenas prova o nível de evolução inferior à consciência do reino mineral que algumas pessoas têm e atestam ao demonstrar uma empatia menor que a de uma pedra. A pessoa não compra algo que o outro gostaria de ganhar, mas aquilo que ela gostaria. Em momento algum a pessoa que presenteia consegue imaginar ou sentir como a outra pessoa que é presenteada se sentiria ao receber aquilo que será dado. Seu egoísmo é tamanho que ela não enxerga mais nada além de si na tradição, ela se vê e sente recebendo o presente e fica feliz e através desta felicidade, que ela sente, é que ela é movida a comprar o presente que dará ao outro. A felicidade é dela para ela, não para o próximo. Se a outra pessoa ficará feliz ou não com o presente que será dado pouco importa e se será um presente efetivo, realmente utilizado, tão pouco. Para ela o que importa é ela se sentir bem comprando e dando aquilo que ela gostaria de ganhar.
Há pessoas que desejam controlar a vida dos outros em tudo. Querem ver a sua verdade sendo seguida e também seus gostos e desgostos e são tão tacanhas que chegam a apelar até mesmo para os presentes natalinos para impor a sua personalidade. Através do presente ela vai impor a sua filosofia, sua cultura e tudo aquilo que venha dela e da sua identidade; do seu Eu, do seu Ego. É o que ocorre quando a pessoa a ser presenteada gosta de uma coisa e a pessoa que presenteará sabe disso, mas gosta de outra coisa, então ela compra o que ela gosta e dá isto à pessoa. Pessoas descontroladas que utilizam a cultura como moeda de valoração fazem isso; idolatram determinados artistas, dos mais diversos ramos (música, cinema, teatro, literatura e etc.) e querem fazer o mundo todo aceitar a qualquer custo que aquilo que gostam é o melhor e assim presenteiam com aquilo que gostam, mesmo sabendo que a pessoa que receberá o presente prefere outra coisa. Para a pessoa que presenteia importa mais a identidade dela ser afirmada através dos seus gostos do que fazer feliz a pessoa a quem está presenteando. Ela não está se importando com quem recebe, apenas com ela mesma.
A pequenez de espírito é tanta que as pessoas chegam a utilizar-se dos presentes de Natal para exteriorizar toda a sua presunção patétitca de quem achando-se dono da verdade e avatar da iluminação deve pregar as boas novas de uma forma inquisitiva e covarde. Pessoas que pensam que só o que elas acreditam e seguem é bom e assim, em seu egocentrismo, acham que tem a missão de corrigir as pessoas mostrando-lhes o caminho correto. Acham que só elas encontraram a verdade e que os outros estão perdidos precisando disso e se utilizam dos presentes, moralmente irrenunciáveis, para poder catequisar. A pessoa está feliz com sua religião, com sua filosofia de vida, resolveu o seu problema com Deus e consigo, está bem, mas a outra pessoa não vê isso, só enxerga a sua verdade e acha que esta pessoa precisa urgentemente disto, então ela compra qualquer material de doutrina para esta pessoa, mesmo que esta doutrina seja repudiada pelo que esta pessoa segue ou acredita. Tudo aquilo que em livre-arbítrio a pessoa rejeitaria através do presente ela acaba recebendo mesmo que nunca utilize, pois moralmente não irá rejeitar o que recebeu “com tanto carinho” da outra pessoa.
No Natal a falta de fé das pessoas as faz achar que precisam agradecer aquilo que receberam dos outros durante o ano através de presentes. É a desesperança que não consegue vislumbrar que as pessoas podem fazer algo pelas outras e por elas puramente de coração e sem querer qualquer coisa em troca. Como elas são incapazes de fazer algo aos outros incondicionalmente acham que os outros também são e por isso sentem-se obrigadas a presentear para agradecer aquilo que receberam dos outros, seja um amparo financeiro, emocional, intelectual ou espiritual. Os presentes que são dados meramente por sentimento de culpa e de débito são fulcrados na incapacidade de vislumbrar uma essência divina doadora, um atributo divino, que o homem como imagem e semelhança de Deus possui e que as pessoas afastadas da Luz não conseguem vislumbrar. Deus quer dar e basta ao homem querer receber e da mesma forma que não se agradece a Deus, que manifesta a sua essência doadora doando, com presentes, não se agradece ao homem, que manifesta sua essência divina de doador também doando, com presentes.
Por toda forma de presentear que não seja motivada por Vontade e por Amor é que surgem aqueles presentes sem-vergonhas, aqueles lixos que dão chamando de “presentes”, aquelas cestas de Natal cheias das piores coisas possíveis e todos os presentes ruins imagináveis. A pessoa que se sente obrigada a presentear vai comprar qualquer coisa só para que conste que deu algo e assim satisfazer os seus demônios interiores. Uma pessoa assim não vai doar-se, não vai dar o seu melhor, não vai pagar o mais caro, mesmo podendo, não vai até onde for necessário para comprar o presente, mesmo também podendo. Ela vai aonde lhe for mais prático, pois a satisfação da pessoa a ser presenteada não importa, o que importa é dar o presente. Assim, as pessoas que recebem todo tipo de lixo de presente não devem interpretar personagens e caras e bocas fingindo que gostaram do que receberam. É preciso ser fiel ao que se sente. Se uma pessoa não gostou do presente que recebeu não deve martirizar-se e sentir-se a pior pessoa na face da Terra por isso. Além do que, ninguém é obrigado a usar o presente horrível que ganhou. Isto de que presente dado não se desfaz é mera moral. Se a pessoa não gosta do presente que recebeu é melhor dar a alguém, que goste e use, do que guardar em casa só de enfeite.
Presentear, querer doar, é um atributo divino, é o homem manifestando a sua imagem e semelhança de Deus, é ato de Amor e por isso deve ser feito com consciência e unicamente por Vontade. Se a pessoa não sente dentro de si o desejo de querer ver a outra feliz pelo presente que irá dar é melhor não gastar dinheiro à toa comprando presentes desmotivados de intenção. Dar presente sem Vontade e sem Amor é tolice, é desperdício de dinheiro e cultivo dos demônios interiores de cada um. É fortalecer os vários Egos que engarrafam a essência divina de cada um. Quando a pessoa dá um presente esperando adquirir moral, para satisfazer seu sentimento de culpa e de débito, para impor a sua vontade, pensando em si, na presunção de ser senhor da verdade e quando dá qualquer coisa só pra que conste socialmente que deu, a pessoa não está agindo com Amor e sem Amor nada vale. Não existe Amor sendo alimentado com isto, apenas os demônios que cada um carrega dentro de si e que fazem as pessoas comprarem estes presentes cheios de egoísmo, avareza, soberba, mesquinhez e egocentrismo. Quando for dar algo a alguém não pense no que você sentiria se recebesse aquilo, mas no que ela sentiria. O presente é para ela, não para você.
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