As adaptações de jogos para as telas do cinema tendem a ser grandes fiascos. As fabricantes dos jogos vendem os direitos às produtoras que apenas querem ganhar dinheiro em cima da marca e assim pessoas que nunca jogaram os jogos e que não tem o mínimo de conexão e empatia com a história acabam sendo responsáveis pela adaptação dos games. Jogos como Super Mario, Street Fighter, Resident Evil e Double Dragon são exemplos maiores de quão falha é a idéia das fabricantes dos jogos não produzirem os filmes. Japoneses fazem os jogos e vendem os direitos para americanos produzirem filmes. Dá no que dá.
Entretanto, Silent Hill pode ser considerado certamente como uma das mais coerentes adaptações de um jogo para o cinema. Obviamente que existiu um roteiro, uma história criada, pois se fossem apenas passar o jogo para a tela seria um live-action e não um filme; porém a história do filme se mantém fiel ao jogo. O filme de Silent Hill “é Silent Hill”, ponto. O que mais chama a atenção no filme foi que há um ponto onde a adaptação foi melhor que o jogo original (Silent Hill – 1.999): uma mãe (Rose) procurando por sua filha ao invés de um pai (Harry). Pode parecer uma coisa simples (trocar o sexo do protagonista) mas isto muda completamente a temática do espírito do negócio.
Nietzsche dizia que “Em geral, as mães, mais que amar os filhos, amam-se nos filhos.”. Não raros são os filósofos que falaram do amor mais incondicional que pode existir: o amor de mãe. Uma das teses que defende o aborto é a que considera o feto como uma extensão do corpo da própria mãe e assim dando a esta o direito de dispor de seu corpo como bem quiser. A mãe que ama o filho como a si mesma, que defende o filho como se defendesse a sua própria vida, e por ele daria sua própria vida.
Durante o filme Rose passa a história toda atrás de sua filha não desfocando de seu objetivo em momento algum. Vai conhecendo personagens, adentrando cenários, mas nada, em momento algum, tira o seu foco: encontrar sua filha. Observando como as coisas são na prática, em todo mundo, em toda a história, por mais que haja exceções, o número de pais que abandonam os filhos é infinitamente maior que o número de mães que abandonam os filhos e isto tem um porquê. A busca de Rose por Sharon é muito mais passional e instintiva do que busca de Harry por Cheryl. Rose se demonstra destemida, não mede esforços e faz de tudo por sua filha. Harry já tem menos sangue correndo nas veias.
Blavatasky dizia que uma mãe poderia fazer tudo para defender seu filho e não cairia sobre si qualquer ação de karma. Harry carece de mais garra, mais raiva, demonstra empatia com quem vai conhecendo o que lhe tira o foco, abre espaços para saber de outras coisas além de Cheryl. Rose não é uma heróina que foi salvar os outros, ela foi salvar sua filha, Sharon. Não pega um segundo sequer para ter qualquer tipo de conversa à toa com quem quer que seja. Não fica de papo com Cibyl como Harry. Rose chega até mesmo a abandonar Cybil logo no começo pois o tempo é curto e não há tempo a perder com qualquer outra coisa que não seja sua filha.
Quanto entra em contato com a Ordem não perde um segundo sequer, não pergunta o que eles são, de onde vieram ou porque estão lá. Seu foco é sua filha e é a única coisa que lhe interessa. Não enxerga nem ouve mais nada, não existe Pyramid Head, não existem sirenes perturbadoras e a única perturbação de Rose é a necessidade de encontrar Sharon. Ela vê Sharon. A odisséia da mãe em busca da filha é o que existe no mundo todo, nas milhares de mães que foram abandonadas pelos pais de seus filhos e que por um motivo ou outro não assumiram a responsabilidade.
A mãe que se desdobra em 2, 3, 40, trabalhando em casa ou fora, não medindo esforços para manter a subsistência do filho. Mulheres que são como leoas e que defendem seus filhos com unhas e dentes. Mulheres para os quais os filhos são sempre indefesos e que não desamparam o filho ao este completar 18 anos como se um filho deixasse de ser filho por causa da idade. Tudo aquilo que a odisséia de Rose em busca de Sharon representa torna singela e tacanha a busca de Harry o qual, em comparação à Rose, demonstra uma extrema falibilidade de garra, determinação, paixão e vontade.
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