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Rudy Rafael

Esopando a Sega

Pra quem acha que infância é só anime e mangá talvez fosse proveitoso ter uma nova realidade e entrar em contato com o pessoal da terra do Sol poente. Com toda certeza, se os japoneses da Sega tivessem conhecido Esopo na infância o negócio hoje seria bem diferente para a empresa. O grego, que certamente honrou mais o seu país do que o time de futebol, que é considerado o pai das fábulas, o gênero literário do qual se utiliza de alegorias, especialmente com animais, para transmitir lições de cunho moral e ético. Uma das mais famosas fábulas de Esopo é a da galinha de ovos de ouro. Um casal de camponeses tinha uma galinha que todo dia botava um ovo de ouro. Então, eles resolveram abater a galinha achando que iriam conseguir todo o ouro de uma vez só e assim alcançar a riqueza. A galinha era como as outras e ao matá-la nada encontraram além de órgãos de uma galinha comum. Nada de ouro e sem fortuna. Eles perderam a galinha e o ovo de cada dia que lhes dava subsistência.

Que a Sega nunca foi a melhor estrategista de mercado do mundo dos jogos não é nenhuma novidade. Depois que lançou atrasado o Master System (outubro/1985) após o Nintendo já ter dominado grande parte do mercado (Nintendo – julho/1983) deu a lançar consoles precipitadamente no mercado sem antecipar a tecnologia necessária para a geração para competir com a concorrência, como o Dreamcast que tem uma taxa de 3 milhões de polígonos por segundo x 75 milhões do Playstation 2, e assim cada vez mais perdendo a geração. Com o Mega Drive teve mais sorte (ninguém ligou para a placa de áudio já que a do Super Nintendo era infinitamente melhor (vide Mortal Kombat e Street Fighter 2)) já que o mercado ainda não tinha descoberto o poder da indústria dos jogos. Depois com o Saturn e com o Dreamcast, chegando ao cúmulo de lançar seu video game de 6ª geração (Dreamcast – novembro/1998) quase 1,5 ano antes do da Sony (Playstation 2 – março/2000) e 3 anos antes do da Microsoft (Xbox – novembro/2001). Não dá pra não ver que tem algo errado nisto.

O mercado de video games têm gerações que duram em média 5 anos e é preciso se preparar para todo este tempo em que ficarão no mercado e não apenas os primeiros meses de lançamento. A Sega lançava na frente, vendia pouco com grande valor e por ser novidade; depois passava a geração toda apanhando. A Nintendo sempre trabalhou muito a questão de evitar a pirataria e a Sony agora conseguiu com o Playstation 3. Quanto mais uma empresa consegue adiar a pirataria mais ela aumenta o tempo de vida do console e quanto maior a pirataria de um console mais próximo do fim ele está. A Sega lançou o Dreamcast sem preocupar tanto com isso como fizeram as concorrentes. É certo que os outros consoles de mesma geração (Xbox e Playstation 2) também tiveram jogos piratas mas tanto a Microsoft como a Sony sempre tiveram o problema da pirataria em pauta procurando soluções; assim como a Nintendo mudava o formato da mídia de tempos em tempos (Nintendo 64 c/cartucho e Gamecube e Wii com discos especiais).

Se os japoneses da Sega conhecessem a fábula da galinha de ovos de ouro certamente não teriam lançado o Dreamcast na época em que lançaram. Estes lançamentos que se precipitam no fluxo natural do desenvolvimento tecnológico só servem para tentar pegar migalhas no mercado. Se hoje lançarem um console de 8ª geração 0,01% melhor que os de 7ª muita gente vai comprar só porque é o melhor video game do mercado. A tecnologia cria escravos. As pessoas têm o que precisam mas se lançarem algo novo em que mude o formato, a cor, um botão a mais, um a menos, compram e com consoles também é assim. Não esperam chegar o momento certo para comprar. Compram porque precisam se sentir inseridas e por isso querem ter o melhor; mesmo que logo depois haja a tecnologia superior disponível. É aí que a Sega sacrifica a sua galinha. Se tivesse esperado para lançar o seu video game de 6ª geração após ter firmado bons contratos com fabricantes, preparado bem o hardware e antecipado todas as possibilidades estaria aí até hoje, tanto na 6ª, como o Playstation 2 que continua a ser fabricado sendo que o Dreamcast foi descontinuado nos Estados Unidos em 2.001, como teria giro pra ter entrado na 7ª.

Quando uma empresa lança um console de nova geração sem se antecipar ao que os concorrentes farão e sem se preparar para competir durante a vida desta geração ela demonstra que quer as migalhas deste curto espaço de tempo em que vai conseguir vender o video game como sendo novidade pois é tão e somente o que lhe resta já que lançou em um tempo errado e quando os concorrentes lançarem o deles não haverá mais concorrência pois serão bem melhores. Em um mundo globalizado, consumista, descontinuar um video game da atual geração no exato ano em que a concorrente lança o seu (Dreamcast descontinuado nos EUA no ano de lançamento do Xbox) é pedir pra fechar as portas. Uma situação destas atrapalha o capital de giro, investimento, as fabricantes se afastam; ninguém faz um contrato de exclusividade com uma empresa cujo console top de linha está descontinuado; isto seria afundar a empresa. O console morto leva a fabricante de jogos junto. Um exemplo da tensa relação da Sega com as fabricantes é a Eletronic Arts, uma das maiores produtoras de jogos do mundo, que não desenvolveu jogos para o Dreamcast; e, de boa, desconsiderar Fifa e Need for Speed mostra o quão de olhos bem fechados estavam os japas.

Se o Japão não queria se ocidentalizar, não seria necessário, poderiam ter se aberto um pouco mais à cultura clássica ocidental (gregos, romanos e alemães principalmente) ao invés de só receber cultura asiática, como a chinesa (budismo, confucionismo, taoísmo e etc.). Poderiam ter conhecido Esopo e a fábula da galinha de ovos de ouro (e quem sabe até Ziraldo, Maurício de Souza e Monteiro Lobato). Saberiam que não adianta vender um produto caro para poucos por pouco tempo e depois ficar a ver navios. Saberiam que é melhor uma galinha que te dê um ovo de ouro todo dia, por anos, do que sacrificar tudo por um momento e que a constância importa mais que a intensidade. Lançaram errado, na época errada, se contentaram com pouco e agora tem que ver o seu xodó rodando na maior concorrente de sua história; tão absurdo como Zico no Vasco, Richie Sambora no Kiss ou Harvey Spencer Lewis na CR+C. Apesar do Japão ser modelo para o mundo em muita coisa talvez fosse necessário mostrar algumas coisas do Ocidente para eles e dar uma boa esopada na criançada.

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