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Fracassados que se escoram em suas vidas passadas

Rudy Rafael

O ser humano é assim: se receber um pão francês é capaz de endurecê-lo para utilizá-lo como arma e atirá-lo na cabeça de outra pessoa para feri-la. De tudo que o homem recebe ele consegue fazer mau uso. Deturpa e macula tudo que toca e assim desenvolve o toque de Midas ao contrário. Por variadas formas e diversos meios recebe conhecimentos e mecanismos que geram oportunidades de construir coisas positivas para melhorar a sua vida e o seu mundo, mas acaba sempre utilizando tudo da pior forma possível. Usa o desenvolvimento da ciência para a criação de armas de destruição em massa ao invés de criar coisas positivas e depois não entende porque a ciência empaca em determinados pontos e não consegue avançar.

Entre os que buscam o desenvolvimento espiritual há pessoas que receberam determinados conhecimentos sobre suas vidas passadas e ao invés de utilizarem estas informações para auto-conhecimento e evolução passam a reviver suas vidas passadas na vida atual porque não aceitam a vida insossa, sem graça e sem ambiente que têm. Se escoram nas vidas que passaram para terem algum sentido no presente, pois sua ignorância lhes cega para suas missões atuais. Rejeitam e renegam tudo o que são; seus nomes, nacionalidades e ofícios, para reviverem o que já viveram, pela necessidade de dar uma graça maior à própria vida através de pretensa autenticidade e assim satisfazer seu ego de individualidade.

A pessoa nasceu como “João”, “Maria”, “José”, “Daiane”, “Juliana” ou qualquer outro nome comum e ao invés de conhecer toda a força e energia que há por trás do seu nome ela evoca seus nomes de outras vidas para impor uma pretensa autenticidade. “Olha, eu nasci como João, mas meu nome é Sei-lá-o-que”, “Meu nome é Maria, mas eu sou a O-diabo-a-quatro”. Outros, nascendo no fim do mundo, ao invés de aproveitarem esta vida que têm no fim do mundo ficam achando que ainda vivem em outros continentes tidos como mais bacanas. Trancam-se no quarto, fantasiam paisagens e adotam posturas de quem vive em outros países, ao invés de explorarem o local onde nasceram e adquirirem novas experiências.

Há pessoas que vivendo uma vida sem graça, trabalhando em profissões não tão chamativas e sem muito status, se escondem no que já fizeram anteriormente. A pessoa tem uma profissão ou trabalho mas reluta em aproveitar o que há de melhor nisso, envergonhando-se do que faz e escondendo-se atrás de ofícios antigos. “Óh, eu trabalho no telemarketing, mas na verdade eu sou a Bruxa Luluzinha que viveu na Alemanha no século XIII”, “Veja, eu trabalho como descarregador de côcos, mas na verdade eu sou o mago Bolinha que viveu na Romênia do século XVI”. Independentemente do que qualquer um faça, toda função é necessária à sociedade e por isso ninguém precisa envergonhar-se do que faz.

O conhecimento sobre vidas passadas está sendo usado como fuga para pessoas ignorantes dos desígnios da Providência Divina e de seu próprio destino. O Ego, engarrafando a consciência, satisfaz-se com as ilusões de Maya através do vislumbre dos reflexos de essências aleijadas. Um dos mecanismos de defesa do Ego é a negação, o qual vem fartando-se entre os espiritualistas que estão negando o que são para recorrerem ao que já foram. O Ego, fortalecendo-se com isso, aprisionará cada vez mais a consciência da pessoa, que poderá passar eternidades desperdiçando experiências através de vidas iludindo-se que o Ser é determinada vivência, a qual escolherá obviamente pelo que lhe satisfaça mais.

Mesmo tendo vivido várias vidas, dos mais diversos níveis sociais, ofícios, nacionalidades, religiões e culturas, através do Ego a pessoa escolherá como sua essência aquela que lhe for mais conveniente. Pode ter vivido como escravo na África do século V, mas não dirá que sua essência é esta; dirá que é a bruxinha que viveu na Alemanha do século XIII. Dizer que tem a essência de um escravo africano do século V não traz tanto glamour quanto dizer que tem a essência de uma bruxa alemã do século XIII e é aí que o Ego se esbalda e escraviza cada vez mais a consciência da pessoa. A pessoa viveu 30 vidas como cristão e uma como bruxa, adivinhe o que irá falar? Que é cristão pelas 30 vidas ou bruxinha pela única?

A pessoa pode ter sido Napoleão, Moisés ou Akhenaton em uma vida passada, isso não importa mais, já passou. Se ela atualmente tem uma vida fracassada, deve lutar para mudar esta situação ao invés de se escorar em ilusões mentais de presunçosas essências melhores. Aquilo que cada um é em cada vida, o conjunto de sua forma física, nome, personalidade, família, ofício, época e local de nascimento, jamais será vivido novamente. É uma experiência única que serve ao propósito da evolução e que, da exata forma que é em cada vida, nunca mais poderá ser repetida e por isso deve ser aproveitada como se fosse a última chance de ter aquela experiência, pois assim será.

O conhecimento adquirido através das investigações sobre as vidas passadas serve como fonte de aprendizado para o auto-conhecimento e evolução, mas deve ser recebido e interpretado de uma forma consciente e mentalmente sadia, sob risco de fomentar ainda mais este pandemônio que está ocorrendo atualmente, de pessoas que não se aceitam e não aceitam suas vidas e ficam assombrando o mundo como espectros ao reviverem insanamente suas vidas passadas na vida atual. Mesmo sendo o homem imortal, cada vida que tem é a primeira e única que terá e esta vida deve ser aproveitada como ela é. A pessoa que não se ama, que não ama o seu nome, seu corpo, seu trabalho, sua terra, o que tem, o que é e que não ama a sua vida não conseguirá amar mais ninguém e conhecimento algum adiantará se não souber amar.

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